MAL ACOMPANHADA
As celebrações começavam pontualmente às dezenove e trinta e terminavam assim que a benção final fosse dada. Se naquele dia um outro compromisso estivesse agendado pelo celebrante, os visitantes e aniversariantes teriam que voltar outra hora, por que o final seria antecipado. O “vamos em paz” nem sempre antes de uma hora, cronometrada. Da posição onde se encontrava era difícil, ao celebrante, não ver quem eram os atrasados para a celebração da santa missa. Uma parte daquela família era pontual, chegavam sempre na hora do Glória.
Como a celebração não era espetáculo teatral, entrar e sair do recinto não era proibido, durante a realização. Se a igreja não estivesse totalmente preenchida, esta movimentação seria difícil de não ser notada. Uma vez ao banheiro, que ficava nos fundos da nave com acesso pela lateral, passando pelas janelas de pequenos basculantes e vidros translúcidos canelados, que pelo deslocamento do vulto não iria para outra parte, inda mais se o intervalo fosse curto. Se o incontido não retornasse logo, ou tinha ido embora, por motivos outros, ou era número dois. A verdade é que não havia diferença entre “Xixi café chiclete”. O sistema era dinâmico. Nunca o celebrante, o servo do senhor, havia se incomodado com este entra e sai.
Mas naquele dia a fiel adentrava a matriz já bem próximo do final do intervalo entre o primeiro e segundo tempo. Veio de olhar fixo, seguindo a voz do orador. Parou diante do altar, gesticulou as mãos, a cabeça e o tronco, em um ritual que causou estranheza no vigário. Este, ao perceber um gesto de saudação, retribuiu da mesma forma, em uma possível troca de gentileza. De cerimônia parada o padre de mãos impostas perguntou à fiel se estava tudo bem, se precisava de alguma coisa e ofereceu assentamento nos primeiros bancos, que quase sempre estão vazios, como cortesia da casa.
Mesmo transparecendo estar fora de si, ou sob efeito de algum entorpecente, ou de medicação controlada ou mesmo com distúrbio provocado pela alta alcoolimetria, sem necessidade de bafômetro, respondeu com o sinal universal do não, balançando a cabeça.
Se está entendendo tudo, por que se faz de sonsa? Se perguntou o servo do senhor. Os fiéis apreensivos, notaram um desconforto na acolhida ao corpo que hora se postava perante o altar.
O extraordinário ministro, pelo tamanho, disposição e firmeza, seu Raul já desabotoando o impecável, cândido e imaculado jaleco, a caminho de encontro à estranha ao culto, foi seguro pela imposição das mãos do presidente da celebração, o santo vigário da paróquia. Pediu um momento antes de qualquer atitude, pois ali tinha mais coisas.
Ainda com as mãos impostas, traçou o sinal da cruz na direção da fiel desorientada. Ela iniciou um descontrolado movimento corporal, indicando-se como incomodada. Primeiro fez um giro de trezentos e sessenta graus com a cabeça e antes de iniciar o golfamento, foi interrompido pelo celebrante:
– Se sujar vai limpar! a igreja esta sem faxineira e amanhã ainda tem missa às dez.
Diante de tal reprimenda, o corpo e suas entidades foram se saído de marcha à ré e antes de alcançar a saída deu tempo de receber mais um conselho:
-Sal de fruta melhora!
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