O cliente era um senhor já na terceira idade e quis saber do farmacêutico se ele tinha remédio para diminuir a vontade de urinar, à noite.
Ele falou ao farmacêutico que acordava no meio da noite com uma vontade incontrolável de urinar, mas que ao ficar de prontidão e encontrar uma latrina, a urina saia ralinha, quase nem tinha o que fazer, apesar da forte vontade e da força que fazia. Este incomodo processo se repetia por mais algumas vezes na mesma noite e estava acontecendo já a algum tempo.
Havia comentado com um conhecido sobre o incômodo e este o havia alertado de que a coisa não seria tão simples assim como parecia ser. Ter vontade de urinar muita gente tem, mas várias vezes à noite, não. Homens, dentro da normalidade, ao se levantarem, a primeira coisa que fazem é esvaziar a bexiga em uma longa e prazerosa mijada. Aquilo era coisa para médico resolver, disse o conhecido, e que o quanto antes ele deveria se consultar. Deu a indicação de um doutor, seu conhecido de outras consultas, e que se ele não desse conta saberia como encaminhá-lo a outros. O companheiro confidente, ainda, não estava passando pelo incômodo, mas já ouvira outras histórias muito parecidas como a que acabara de ouvir e pelo que ele havia reportado, em alguns casos tiveram um fim trágico. Conforme lhe disse, aquilo era câncer.
Com aquela doença ninguém poderia brincar, teria, o paciente, que enfrentar fila para o atendimento, pois o médico era muito requisitado. Com sorte ele poderia marcar para o próximo mês. E assim o fez.
No dia da consulta, como sempre, havia se antecipado. Estava ansioso. Ele era das antigas, pontualidade acima de tudo. Até que desse a hora da consulta ele aproveitou para passar na farmácia que ficava próximo ao ambulatório do INPS. Ali poderia pedir alguns esclarecimentos ao farmacêutico e informado, poderia aproveitar melhor os três minutos reservados pelo médico para atender cada paciente em suas consultas.
Ao chegar à farmácia, se desculpou com os atendentes e disse que não ia querer comprar nada, que só aguardaria o horário da consulta com o doutor recomendado ali bem próximo, no ambulatório do INPS. Se o farmacêutico estivesse ele ia aproveitaria para pedir alguns esclarecimentos com ele. Como um esclarecido dispensador de medicamentos, o farmacêutico logo se dispôs em atender o impetuoso cliente. O cliente disse que confiava, e muito, nos farmacêuticos em detrimento até dos diagnósticos de médicos. Para ele às vezes a experiência de quem lidava com tudo que era enfermidade e todos os dias valia muito mais. Então ele contou a história da incômoda mijadeira noturna. Durante o dia até que ele tinha uns acessos, mas nada que o incomodasse, pois acordado e tendo um local adequado, a necessidade fisiológica seria atendida prontamente. Outro problema era com o jato urinário, que se tornou descontínuo precisando até fazer força para ter a sensação de que havia terminou de urinar.
O farmacêutico lhe ouviu atentamente e disse que se tratava de um caso bem típico para pacientes com a idade do cliente. Ele estaria com problemas na próstata, mas que só o médico poderia fazer um diagnóstico mais preciso. Naquela idade a próstata cresce e comprime o canal da urina impedindo o completo esvaziamento da bexiga, por isso as constantes vontades de mictar com progressivo esforço. Este crescimento poderia ser um crescimento normal ou em outros casos poderia ser um câncer. Reforçou com o cliente a necessidade de uma consulta com o médico.
Um problema ainda maior era que o seu conhecido, para quem ele havia confidenciado o assunto, falou de um tal de exame em que o médico “atola o dedo no cu da gente”. Seria isso uma verdade? Quis saber daboca do experiente farmacêutico. Este, no maior cuidado possível, lhe disse que um dos exames para o diagnóstico era mais ou menos aquilo que o cliente descrevera. Haveria necessidade de se examinar a glândula que ficava bem próximo ao monossilabo orifício. Disse que, por se tratar de um exame de saúde, o médico estaria no exercício da profissão e que não caberia qualquer outra intenção. Disse também que muitos outros pacientes já passaram, e que passarão, por este exame. Ele seria apenas mais um, a diferença seria que ele estaria informado do assunto.
O paciente ficou desapontado com as informações do farmacêutico. Esperava ouvir uma opinião contrária em relação ao do seu conhecido, principalmente em relação ao dedo do médico. Comentou com o farmacêutico o constrangimento que ele teria que passar. Ele, um senhor íntegro e honesto, nunca se imaginou em uma situação como a que teria que passar, ou seja, na qual um estranho lhe tocaria na intimidade. Reclamou com o farmacêutico que o dito local era onde os “baitolas” sentiam prazer. Ele não estava acreditando, mas o farmacêutico lhe disse que era coisa da medicina e que em relação às coisas de saúde às vezes deveríamos guardar os pudores para outras horas.
O farmacêutico ainda lhe disse para aguardar o momento da consulta e que às vezes o doutor poderia dispensar o exame, se achasse necessário. Tem um exame que faz com o sangue, para saber se a pórtata esta alterada.
Como últimas palavras, antes de se dirigir ao ambulatório, o cliente lhe perguntou se haveria alguma chance de o indivíduo gostar daquela invasão da intimidade? E o farmacêutico lhe respondeu em sua sábia filosofia comercial que, para muitos pacientes, eles deixam de apresentar aquela resistência inicial ao exame.