Sem sonda

Sem sonda

Depois da cirurgia ganhei uma companheira inseparável, a sonda uretral junto com a bolsa coletora. Ficaríamos juntos por no mínimo uns quinze dias. Os pontos cirúrgicos, quinze no total, eu retiraria depois disso.

Meu estado geral, no pós-cirúrgico, era bom. Fiquei em repouso, sem me abaixar e sem fazer movimentos bruscos. A sonda me restringia os movimentos. Eu achei poucas posições para me acomodar na cama, tomava banho de forma lenta e os curativos eram feitos bem devagarzinho.

Agendei com o doutor a retirada da companheira. Avisei as crianças que elas não iriam à natação naquele dia. A Laura me perguntou se eu estava preparado para ficar sem sonda. Eu lhe respondi que achava que sim. Só depois eu entenderia o motivo da pergunta que ela me fez. Criança tem cada premonição.

No consultório o doutor foi bem direto. “Vamos chegar para cá, antes que a coragem acabe”, disse-me ele, me chamando para o banheirinho nos fundos da sala de consulta. Ele com uma seringa em mãos pediu para abaixar a roupa e retirou um líquido por um dos tubos da sonda. Disse-lhe que minha filha tinha me perguntado se eu estava preparado, aí ele, sem parar o procedimento, me perguntou: por que será? E com um movimento, retirou a sonda. A companheira saiu rasgando. Confesso que por alguns instantes ofeguei e vi estrelas!

O procedimento foi rápido, mas dolorido. O doutor se desculpou, dizendo que não havia anestésico e que quando uns dez gatos, e suas unhas, se juntam é difícil controlá-los. Isso passa? Vai doer só hoje, amanhã, só na hora de urinar. Caramba! Trouxe a frauda? o doutor ainda me perguntou.

O doutor repassou outras recomendações como beber bastante água. Só água? Queria saber se podia tomar chá! Claro que sim, um vinhozinho também. Cerveja… tem que ser gelada! Outra coisa: toda vez que terminar de urinar, contraia o ânus! Como? O c.. Doutor isso vai ser moleza, eu já faço isso a vinte e dois anos, é não é só na hora de urinar. Toda vez que saio para trabalhar só saio de c.. trancado.

No outro dia quando falei com o Pimenta, me lembrei da recomendação do doutor. Eu entrei em contato com ele para solicitar a leitura de dois textos que produzi para uma coletânea, que a professora Bernardelli está organizando. Ele me disse que leria, pois estava em casa, aguardando a reserva. Ele também contou que as férias forçadas estavam sendo a melhor coisa que lhe ocorreu nos últimos tempo. Se sentia aliviado, com vontade até de caminhar todos os dias e que está bebendo menos. Lembrei do doutor por que me perguntei: será que ele também contraía o ânus todos os dias quando ia trabalhar e agora o alívio?

No consultório o doutor me disse ainda: Toma Pyridum de oito em oito, para aliviar a dor. Agradecido doutor. Volta semana que vem para retirar os pontos e me traga o resultado do exame de urina.

Saímos do consultório e fomos buscar as crianças na casa da vó. A dor era terrível. Mal esperava para chegar em casa, sem a sonda, e me deitar e poder rolar na cama, mas com parcimônia, ainda restavam os quinze pontos.

Enviei um whats para os grupos das famílias relatando a dor. Muitos se compadeceram, mas nada podiam fazer. O jeito foi aguentar. Meu consolo seria a cerveja gelada liberada e o exercício com o ânus.

Passei a experimentar uma sensação de liberdade, sem a sonda. Dentro em breve estaria melhor. Espero que dentro em breve deixe a fralda que passou a ser minha nova companheira. A contração anal ativará a musculatura da saída da bexiga e da uretra, que controla a micção. Se por acaso houver urina na bexiga eu não posso peidar, que aí relaxa tudo.

No dia posterior, já bem mais ágil, acordei logo cedo, e senti até a respiração aliviada. As dores estavam diminuindo.

Conversei com o Marcelo, meu primo. Colocamos as notícias em dia. Ele está em emprego novo, acabara de retornar de Goiânia. Ele quis saber de minha saúde, e eu lhe disse que estava tudo dentro dos conformes, havia retirado a sonda e enfrentado unhas de dez gatos juntos.

Contei-lhe que o doutor me disse que minha atividade sexual ficaria prejudicada em 10%. O doutor me disse para tomar cuidado com cafezinho quente em copo descartável, que poderia queimar os dedos, a língua e aí comprometeria o resto. Me disse também que eu não iria mais “fuder” a vida de ninguém e que achava que já estava bom, que eu já tinha “fudido” a vida de muita gente. Como é bom não perder a oportunidade e rir da própria desgraça. Mas estamos vivos isso é o que interessa.

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