Ode aos 49

Ode aos 49
Aloízio de Oliveira
Aos 49 anos um homem deixa de ser exigente e se tiver que fazer questão, vai ficar com o mais simples, isso evitará fadiga. Nesta idade passa a valorizar detalhes ocultos, foge do senso comum. Acaba a pressa pois sem ela não sentirá o gosto de uma boa cachaça, mesmo que em pequenas dose de R$ 0,50.
Curte uma contemporaneidade. Veio ao mundo com o advento da TV e cresceu assistindo a programação e aos 49 ainda assiste, mesmo achando tudo repetitivo. Em alguns momentos, acha alguma graça onde ninguém acha, e nem achariam, mesmo com todas as suas legendas. Os horários picantes, que antes eram chamados de nobres, agora exibidos mais cedo, as atrizes já não lhe chamam mais atenção, acha que os estereótipos e as estereotipadas fazem parte de uma moda ditatorial. Resmunga desapontado “-Tudo silicone, lentes de contato, mega hair, cadê a natureza?”
Sempre foi uma pessoa bem afeiçoada, expansiva, comunicativa… mas aos 49, restringe seus relacionamentos amorosos (o plural foi forçado!), a uma vida monogâmica. Às vezes, se achar assexuado por “algumas” de seu círculo de relacionamento (gostosas e atraentes em off!). Nas rodas de comentários, onde, excedidos os níveis etílicos, confidenciam ao lobo-mal o caminho mais curto na floresta.
A pratica de esporte nunca foi seu forte, procurou, sempre que pode, acompanhar os eventos esportistas torcendo pela seleção, seja ela de futebol ou vôlei, pelo Corinthians, pelos brasileiros na Fórmula um. Aos 49 desistiu de assistir por que mesmo que o Massa vença, a sensação de ter assistido o Sena vencer lhe parece incomparável, insuperável e etc. Também isto lhe aconteceu quando ele tinha uns vinte e poucos anos. Da seleção de futebol só tem saudade daquela da Copa de 82, o 7 x 1, foi a pá de cal. O “-Vai Corinthians!” agora é só para mantê-lo no topo da Tabela.
Dos seus vinte e poucos anos só sente saudades das oportunidades não dos desempenhos. Mas oportunidade é oportunidade não é treino, muito embora é o que hoje depois de muito treino! Aos 49 guarda reservado o fôlego para aqueles momentos que pela sua experiência, tem se tornado menos periódicos. Já não acontecerão a qualquer momento, mas conforme programação e agendamento, afinal de contas o que fará com esta reserva, se sozinho já não possui aquele ânimo de outrora.
Nessa idade já não tem controle sobre “certas” partes do corpo, acho que nunca teve. Sempre perdeu na brincadeira do morto-vivo. A princípio “-Morto, morto, mortoooo!” agora “-Vivo, Vivo, vivoooo!”.
Sempre se disse eclético e que para um chamamé era muito mais. Nos seus 49 anos, se bem pode se lembrar, nunca pediu para trocar o som ambiente, só o volume lhe tem incomodado e sua deficiência auditiva progressiva está sendo compensada ao ter que ouvir “Ai, ai, aiai, aiai, iuu, aiai iuu aiai…”.
Aos 49 redobra-se a atenção ao figueiredo* pra ver até onde ele aguenta. *Quem chama fígado de figueiredo deve ter mesmo 49 anos ou mais. Cada dia que passa a quantidade etílica aumenta e as ressacas diminuem e ele acha que isso é sinal de maturidade, mas nunca considera que esta insensibilidade não é indicativo de boa saúde. Comida sim acaba com a saúde, se algo lhe pesa a digestão, a culpa é sempre de uma azeitona.
Aos 49 o hábito de leitura se acentua e quanta coisa poderia ter sido lida, quantos conceitos equivocados teriam sido evitados, mas tudo foi postergado. A escrita também se acentua só não lhe é mais intensa por que é uma atividade solitária e como ultimamente tem se envolvido em outras mais, a coisa vai ficando pra depois.
Aos 49, convence-se de que perdão e desculpa são apenas palavras que representam gestos, não comportamentos, ainda restaram ressentimentos. Em lugar disso prefere acreditar que vai haver outra oportunidade e que o passado é a única coisa sobrevivente e que além de ser guardado ainda poderá ser remoído, ou não!
Aos 49 tem apenas duas certeza: 1- Não existem amigos; 2 – Existem interessados. Se existem amigos, são poucos e são verdadeiros. O que se chama de amigo(a) deveria ter outra nomenclatura: companheiro(a). Se estes conceitos são certezas os amigos desaparecerão quando desaparecerem os interesses.
Aos 49, acha que os filhos cumprirão um ciclo, sendo que desta vez quem assume o papel de pai é ele, na sua vez, e se aceita pagamento com a mesma moeda. Terá nesta idade prazer em responder questões sobre a terra, o mar, a mata, as pessoas, o trânsito, o alimento, a TV, etc. Questões fáceis aprendidas pelas vivências e suas conveniências.
Aos 49, pode achar graça de todas as pelejas perdidas, de todos os embates em que foi derrotado, de todos os seus argumentos frustrados, pois os vê “desacontecendo” no transcorrer da vida. Ri (discreto) ao encontrar um contemporâneo livre de suas antigas convicções, principalmente as no tocante a Deus. Hoje acreditam em tudo.
Se dos 49 anos tem mais, quem sabe numa próxima…
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